sexta-feira, julho 15, 2005

Swing

As luzes apagaram-se finalmente, deixando tudo iluminado pela suave penumbra que emanava da lua, que estava cheia naquela noite. Lentamente, tudo foi ficando silencioso, à medida que todos se recolhiam, e se entregavam a uma noite de sonhos. Lá fora estava uma noite calma, quente, em que apenas se sentia o sopro da brisa de verão.
As respirações que se ouviam eram já pesadas, denunciadoras dum sono profundo, quando a primeira porta se abriu. Sairam lá de dentro devagarinho, com passos cuidadosos e estudados, e dirigiram-se ao salão de baile, completamente vazio e mudo àquela hora.
Com o passar dos minutos foram chegando mais e mais casais, enchendo o salão com um brando burburinho de conversas mal abafadas, num crescendo de excitação. Alguém tinha posto uma música lenta a tocar, para preencher o ambiente, e dar-lhe um toque de cor. Aos poucos, os casais foram-se diluindo, misturando, dançando num frenesim de parcerias anónimas e fora do habitual.
Lá fora o mar agitava-se, as ondas embalavam o barco, e ajudavam nos passos de dança. Lá dentro os corpos saboreavam-se ao sabor do mar, tocavam-se, beijavam-se, experimentavam-se mutuamente, casais insólitos que se davam a conhecer.
A festa tinha atingido o seu auge, transpirava sensualidade e sexualidade por todas as portas, e o barulho não era mais contido pelas paredes do salão de baile, impregnava toda a embarcação. Uma porta abriu-se de repente, deixando entrever um ancião carregando uma lampâda de azeite, que lançou uma luz, tremeluzente e insegura, sobre toda aquela cena.
Noé olhou consternado para a imagem que mais uma vez se apresentava aos seus olhos. O elefante beijando lascivamente a hipopótama, a serpente insinuando-se por entre as patas da ursa polar, vários casais, trios, e aglomerados incontáveis de criaturas, num festim de luxúria.
Todas as luas cheias era a mesma coisa, os animais não continham a energia acumulada por tantos dias de cativeiro na Arca.