segunda-feira, junho 20, 2005

Contradança

Move-se lenta e sensualmente, oferecendo uma visão das nádegas ao homem que se encontra sentado à sua frente, naquele cubículo sujo. Uma música antiquada e untuosa enche todo o ambiente, e proporciona-lhe uma cadência erótica para abanar as carnes flácidas. A sua pele há muito que perdeu o brilho que deslumbrara a todos, e o cabelo já não era sedoso e brilhante como noutros tempos. Ela fora a mulher mais requisitada da cidade, prostituta de tão alta classe que merecera uma designação à parte, “acompanhante”.
E era isso que ela fazia, acompanhava os homens de negócios a festas e reuniões, fazia-os sentirem-se importantes e sedutores, olhava para eles com uma falsa pose de deslumbramento. Quando eles lhe agradavam, eram suficientemente bonitos e se interessavam por ela, dormia com eles, à laia de prémio máximo. Nessa altura era-lhe permitido escolher, e as suas conquistas, embora pagas a peso de ouro, gabavam-se por toda a cidade de a terem possuído.
No fundo, ela achava-os todos uns imbecis. Os homens não lhe mereciam consideração, e tratava-os como mera fonte de rendimento, embora os deixasse sempre na ilusão que eram eles os dominadores daquela transacção.
Mas os anos foram passando, e o seu lugar era seriamente cobiçado por muitas pós-adolescentes, com corpos de ferro, moldados em longas horas de ginásio, e por vezes, algumas de cirurgia. A experiência, que lhe garantia mesmo assim um lugar de topo, foi-se deixando ultrapassar pela acção da gravidade. Subitamente, o seu corpo já não era tão apetecível, os seus olhares lânguidos estavam vulgarizados, e os clientes já não se sentiam especiais por desfilarem com ela pelo braço.
Muitos continuavam a requisitá-la, mais por hábito adquirido, do que por vontade verdadeira. E ela, que sempre vivera acima das suas posses, encontrava-se numa espiral descendente, cada vez com menos dinheiro par se sustentar, e menos capacidade para o conseguir.
Nunca chegara a ser prostituta de rua, não conseguiria descer a esse patamar, preferia morrer de fome. Agora era uma “bailarina exótica”, num clube de quinta categoria, dançava fechada numa montra, protegida dos velhos desdentados e babosos que se masturbavam à sua conta. Tinha orgulho nos seus peitos caídos, que tinham sido amassados por tantas mãos, nas suas coxas, agora com celulite, mas que tinham sido verdadeiros troncos de árvore que enlouqueceram muitos homens.
Meneava as ancas, com um dissimulado sorriso de desprezo nos lábios. Sabia que ninguém o veria, ninguém olha na cara duma pessoa como ela, foi a primeira coisa que aprendeu quando entrou naquela vida. As putas não têm cara, nem coração, e só assim são felizes.