terça-feira, agosto 29, 2006

Bolinha no canto superior direito

Revolvia os olhos rapidamente, olhava freneticamente para o ambiente que a rodeava. Tudo lhe era estranho, nunca tinha visto o mundo daquela perspectiva. Era tudo tão negro, tão árido e áspero. Quase diria que o seu novo mundo era todo feito de asfalto quente e doloroso.
Sentia-se tremendamente pequena, vulnerável e exposta aos perigos do mundo. Algo se tinha passado na sua vida, um trauma terrível que ela não conseguia identificar.
Ouvia sirenes como pano de fundo, sentia uma humidade morna a envolver-lhe a cabeça, a pesar-lhe nos cabelos.
Revirou os olhos, olhou em volta tentando reconhecer algo do local onde se encontrava. Sentia-se cada vez mais cansada, com dificuldade em ter um raciocínio coerente. Era como se tudo lhe fugisse rapidamente debaixo dos pés, enxaguado por aquele liquido morno e espesso.
Já quase não via nada, apenas distinguia formas. Sentia a consciência a escapar-se-lhe nas pontas dos dedos que já nem sentia. Lá ao fundo, pelo canto do olho, percebeu uma forma que lhe era familiar. Conhecia aquelas mãos sapudas, aquelas carnes moles, as pernas maciças. Reconheceu o seu corpo deitado sem vida no asfalto, decepado violentamente.
E depois disso, mais nada.