quarta-feira, janeiro 05, 2005

Tonalidades

A vida dele era a preto e branco e alguns tons de azul. O azul era para os números, frios e impessoais que sempre o rodearam, e que ele tanto gostava. A média de idades das namoradas que já tivera, e o desvio padrão do seu QI. A soma de todos os salários que já auferira, o total de transferências bancárias mensais para contas de ex-mulheres e quase-filhos. A multiplicação exponencial de pombos na cidade, que o deixavam louco porque estragavam a pintura do carro novo.
Já tinham existido outros tons na sua vida. Uma vez acreditou que estava apaixonado e pareceu-lhe distinguir algum vermelho. Mas depois viu que estava enganado, e agora, à distância, percebe que apenas tinha sido sépia. Já desistiu de procurar a mulher arco-íris, aquele mito de todos os homens, e das suas hormonas da adolescência. Vai-se juntando a mulheres como ele, com vidas a preto e branco e alguns tons de nada.