terça-feira, fevereiro 08, 2005

A Última Viagem

Chegar ao Céu é difícil. É uma longa caminhada por aí acima, sempre a subir de nuvem em nuvem. Já morri há mais de quinze dias e ainda não consegui lá chegar. Também nunca fui conhecida pelo meu sentido de orientação, e isto ainda está pior sinalizado que as ruas de Lisboa. Já parei umas 5 vezes para pedir indicações, mas os senhores dos aviões não foram muito simpáticos. E acho mesmo que um deles foi bastante desagradável e não estava a ser correcto quando me indicou o caminho para a Rua do Pariu. Pelo menos foi isso que me pareceu.
Mas continuo em plena subida, e aqui em cima faz muito frio. Devia ter trazido uns agasalhos, mas as agências funerárias estão cada vez pior, nem sequer têm umas brochuras a indicar as vacinas que devemos levar, e cuidados a ter na última viagem. E as nuvens também não são tão confortáveis como se apregoa por aí. Experimentem dormir numa sem saco cama, e depois digam-me como se sentiram. Eu ando com uma dor nas cruzes que já não me aguento. E, claro está, que isso também me atrasa na subida. Ainda ontem fui miseravelmente ultrapassada por uma miúda de 15 anos que tinha morrido há menos de dois dias. Ainda tentei acompanhar os passos dela, mas já deitava os bofes pela boca e tive de parar para descansar. Bem me parecia que não devia ter comido tanta fast-food, e que devia ter perdido aqueles quilinhos que o médico aconselhou.
Mas agora é tarde para pensar nisso, é melhor é ir preparando um discurso comovente para dar ao São Pedro, senão cheira-me que ainda perco as gordurinhas numa sauna eterna.