terça-feira, fevereiro 15, 2005

O Táxi

Já era tarde, estava cansada, e resolveu que o melhor era mesmo apanhar um táxi. Precisava de descansar, porque no dia seguinte, apesar de ser sábado, tinha ainda que trabalhar. Entrou meio esbaforida, cheia de sacos, com um ar desgrenhado de quem tinha passado o dia a correr.
“Para a minha rua, por favor.” Arranjou os sacos no banco, sentou-se melhor, e recostou-se, respirando fundo. Finalmente uns minutos de descanso, a olhar para a passagem dos candeeiros da rua. Gostava de observar o movimento dos carros, enquanto se embalava com as mensagens o rádio táxi.
Estava longe, perdida nas suas comédias românticas internas, quando pararam num semáforo. Sentiu um olhar penetrante através do retrovisor, e não foi capaz de o retribuir. Era um olhar bonito, prescrutante e intenso, como o dela própria. Não aguentou e voltou a olhar para as movimentações automobilísticas do lado de fora da janela.
Mas os seus olhos eram atraídos para aquele espelho, como se fosse um íman. E foram assim, trocando sorrisos e olhares profundos. Não se sentia incomodada, apesar de ser uma pessoa que não gostava de interacções indesejadas, sempre preferira passar despercebida no seu canto.
Estava a chegar o fim da viagem, e de repente desejou que ele não parasse, que seguisse sem destino, às voltas pela cidade, olhando-a com olhos de desejo, sentindo-se bonita no reflexo que não era visível naquele espelho. Desejou que ele seguisse sempre em frente, sem rumo, saísse das portas da cidade, estrada fora, sempre a olhá-la. Desejou ser amada assim, no fundo daquelas retinas que a fixavam, sempre em movimento, felizes para sempre numa realidade paralela.
“São 4.50€.”
“Fique com o troco. Obrigada e bom fim de semana.”