A Velha das Pipocas
Ao fim da tarde, a partir do final do Inverno, quando o sol começava a aparecer e a aquecer os corpos fartos do frio, ela começava a passar os finais de tarde naquele jardim. Sentava-se no banco de ripas de madeira, pintado de verde, bem junto ao lago com a fonte no centro, e cheio de peixes vermelhos, enormes carpas, quase tão velhas como ela, que se passeavam indolentes pela paisagem sempre igual. Levava pedaços de pão do dia anterior, e entretinha-se a alimentar os peixes, jurando a pés juntos que eles a reconheciam quando chegava. Tinha dado nomes a todos, e conseguia distinguir cada um deles, simplesmente pela maneira de nadar, ou pelas peculiaridades das barbatanas.
Os cisnes e os patos reais já a reconheciam só pelo andar, e mal a divisavam ao longe, vinham a nadar graciosamente até ela, esperando receber o pão que escapava aos peixes. Cada um deles tinha recebido também um nome, e ela acariciava-lhes suavemente a cabeça enquanto desabafava as novidades dos filhos e dos netos.
Os meninos da escola em frente vinham ter com ela no intervalo grande, esperando ouvir alguma história dos tempos antigos, em que ela vendia balões e pipocas à porta do Jardim Zoológico. Ela sempre adorara crianças, e agora que até os netos já eram quase adultos, vinha matar saudades com estes meninos, sempre ávidos de a ouvir.
Às vezes trazia milho, e isso era o que os miúdos mais adoravam. Ela colocava uns grãos nas suas mãos abertas, e dezenas de pombos rodeavam-nos, alguns pousando nas mãos estendidas que se ofereciam. A principio os meninos tinham medo, retraíam-se e fechavam as mãos, evitando o contacto. Mas com o passar do tempo, habituavam-se ao toque estranho das patinhas, e riam com gosto quando ficavam cobertos de pombos até à cabeça.
E todas essas tardes as crianças ajudavam a mascarar a sua solidão. Os filhos tinham vidas ocupadas, trabalhavam muito para manter um nível de vida confortável, não tinham tempo para perder a conversar com a velha mãe, e ouvir as mesmas histórias repetidas até ao infinito. Os netos estudavam ainda, e ela bem sabia como a faculdade era exigente, despende-se muito tempo na preparação dos exames, e há que estudar muito para se estar pronto para a vida adulta. Não se pode desperdiçar a vida a tomar conta duma velha avó, que ainda por cima fala com patos e pombos.
Por vezes vinham visitá-la, preocupados com a sua saúde. Sugeriam-lhe um lar, dos melhores da cidade, cheio de todas as comodidades, enfermeiras solícitas e ambiente asséptico. Onde não teria de se preocupar com as limpezas da casa, com fazer comida, e onde cuidariam dela com todos os pormenores.
Mas ela dizia sempre que não. Preferia ficar na sua casa, mesmo sozinha, mas onde se sentia ainda livre e senhora da sua vida. Livre para passear por onde quisesse, para alimentar os patos, peixes e pombos do velho jardim do seu bairro, para animar as crianças da escola, e encher as suas vidas de sonhos, com histórias de animais distantes que só podiam ver no Zoo. Ensinar os nomes de cada bicho, de onde vinham, como cada um era importante e especial, tal como cada menino que se cruzava com ela na vida.
E todas as tardes a partir do final do Inverno, eles iam ter com a avozinha, como carinhosamente lhe chamavam, e aprendiam uns com os outros, e preenchiam as suas vidas com o cheiro das pipocas.
Os cisnes e os patos reais já a reconheciam só pelo andar, e mal a divisavam ao longe, vinham a nadar graciosamente até ela, esperando receber o pão que escapava aos peixes. Cada um deles tinha recebido também um nome, e ela acariciava-lhes suavemente a cabeça enquanto desabafava as novidades dos filhos e dos netos.
Os meninos da escola em frente vinham ter com ela no intervalo grande, esperando ouvir alguma história dos tempos antigos, em que ela vendia balões e pipocas à porta do Jardim Zoológico. Ela sempre adorara crianças, e agora que até os netos já eram quase adultos, vinha matar saudades com estes meninos, sempre ávidos de a ouvir.
Às vezes trazia milho, e isso era o que os miúdos mais adoravam. Ela colocava uns grãos nas suas mãos abertas, e dezenas de pombos rodeavam-nos, alguns pousando nas mãos estendidas que se ofereciam. A principio os meninos tinham medo, retraíam-se e fechavam as mãos, evitando o contacto. Mas com o passar do tempo, habituavam-se ao toque estranho das patinhas, e riam com gosto quando ficavam cobertos de pombos até à cabeça.
E todas essas tardes as crianças ajudavam a mascarar a sua solidão. Os filhos tinham vidas ocupadas, trabalhavam muito para manter um nível de vida confortável, não tinham tempo para perder a conversar com a velha mãe, e ouvir as mesmas histórias repetidas até ao infinito. Os netos estudavam ainda, e ela bem sabia como a faculdade era exigente, despende-se muito tempo na preparação dos exames, e há que estudar muito para se estar pronto para a vida adulta. Não se pode desperdiçar a vida a tomar conta duma velha avó, que ainda por cima fala com patos e pombos.
Por vezes vinham visitá-la, preocupados com a sua saúde. Sugeriam-lhe um lar, dos melhores da cidade, cheio de todas as comodidades, enfermeiras solícitas e ambiente asséptico. Onde não teria de se preocupar com as limpezas da casa, com fazer comida, e onde cuidariam dela com todos os pormenores.
Mas ela dizia sempre que não. Preferia ficar na sua casa, mesmo sozinha, mas onde se sentia ainda livre e senhora da sua vida. Livre para passear por onde quisesse, para alimentar os patos, peixes e pombos do velho jardim do seu bairro, para animar as crianças da escola, e encher as suas vidas de sonhos, com histórias de animais distantes que só podiam ver no Zoo. Ensinar os nomes de cada bicho, de onde vinham, como cada um era importante e especial, tal como cada menino que se cruzava com ela na vida.
E todas as tardes a partir do final do Inverno, eles iam ter com a avozinha, como carinhosamente lhe chamavam, e aprendiam uns com os outros, e preenchiam as suas vidas com o cheiro das pipocas.
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