domingo, abril 30, 2006

Marnie

Marnie era um pequenito duende, com um ar forte e robusto, pernas musculadas, e braços endurecidos por anos de trabalho. Andava sempre com um barrete verde, um colar com uma das suas falsas moedas de ouro, e tinha o eterno ar de adolescente maroto de todos os duendes. Marnie era um Duende Cavador. Para todos aqueles que não estão familiarizados com os nossos amigos mais pequenos, aqui vai a explicação. Um Duende Cavador carrega sempre consigo uma pequena mas eficaz pá, e está encarregado de cobrir as humilhações do mundo. De cada vez que um de nós se sente envergonhado até à medula, aparece um destes duendes trabalhadores, cava um buraco profundo à nossa frente e enfia-nos lá pelo tempo necessário para esquecermos que fomos humilhados e enfrentarmos o mundo de novo.
Ele gosta de rondar restaurantes românticos e cinemas, sítios de primeiros encontros entre pessoas que estão a tentar entender-se e atrair-se. São alturas muito ricas em frases que mereciam ser apagadas para sempre da história da humanidade, que fazem quem as proferiu desejar ter um buraco à frente tão profundo que nunca mais de lá saísse. E Marnie ajuda-os a cumprir o seu desejo, cava um buraco fundíssimo numa questão de segundos e a pessoa enterra lá a sua vergonha.
Também gosta de visitar escolas, mas o trabalho aí é demais até mesmo para um duende tão empenhado como o Marnie. Há sempre alunos a ser envergonhados no quadro pelos professores, miúdas que sofrem pelas roupas que os pais as obrigaram a vestir de manhã, e que não são o ultimo grito da moda, rapazitos que falham penalties importantes. Depois dum dia passado numa escola, Marnie precisa de 3 dias a descansar num buraco cavado por ele.
Discotecas em final de noite também são um local engraçado, embora não tão trabalhoso. Os bêbados não se envergonham dos seus actos, tal como não têm consciência deles. Mas com sorte, há sempre uma namorada que ficou para trás e que morreria de humilhação se não fosse o buraco do Marnie para enterrar a sua vergonha. E num dia em que o trabalho tenha sido pouco, pode sempre seguir um dos festeiros até sua casa e esperar que ele acorde e embata de novo com o mundo. Muitos deles nunca mais se levantariam, se não fosse o buraco do nosso amigo onde enterram as suas desonras.
Mas há sítios onde o Marnie nunca encontra o que fazer. As férias passa-as sempre na Assembleia da República, nas galerias sentadinho a dormir, a recuperar forças para de novo enterrar as desonras do mundo.
Muitas vezes penso no Marnie, que tanto me ajudou na minha adolescência, e que mesmo hoje em dia convoco muitas vezes. Sem ele não poderia ter continuado, e ainda me lembro de muitas alturas em que se não fosse ele nunca mais me levantaria da cama. Conheço de cor os locais de Lisboa onde estão enterradas, e ao caminhar na rua penso sempre de quem serão as vergonhas que estão debaixo dos meus pés.

terça-feira, abril 25, 2006

Efemérides

Onde estavas no 25 de Abril, essa data tão importante e emblemática do nosso passado? Se bem me recordo estavas na cama duma lambisgóia qualquer, a lambuza-la de cravos vermelhos e beijos de mel, perfeitamente imbuído do espírito revolucionário passivo que tão bem nos define. Sempre foi assim toda a nossa vida, as efemérides nunca as passámos juntos. Só te lembras de mim quando a fome aperta e os meus braços te parecem alimento.
E eu, esposa amantíssima convencida do seu papel aglutinador da sociedade decadente em que vivemos, cá te espero de braços abertos e recriminações na ponta da língua. Alimento-te na cama e na mesa como animal ferido com medo do mundo, até te sentires de novo livre e forte para sobrevoar e rapinar as mulheres alheias.
Já nem saberia viver doutro modo, sou livre e feliz à minha maneira, fazendo o papel da esposa humilhada quando não estás, e da mulher corajosa e altruísta quando regressas de rabo entre as pernas.
“Para quê aturar os defeitos de outro, quando já conheço de cor os deste?”, comento com as vizinhas coscuvilheiras com ar sofredor, gozando da atenção extra que me é dispensada. “Coitado, eu tenho sofrido muito, mas desta vez ele vem para ficar.” Cruzes canhoto, Deus me livre que isso fosse verdade!

segunda-feira, abril 24, 2006

Cinemas e caminhadas.



Tenho andado pelos caminhos do indie a ver alguns dos filmes que por lá passam. Até agora o saldo tem sido francamente positivo. Gostei muito do Megacities, que vi esta noite, e da sessão que perguntas com o realizador que se seguiu. Gostei também muito do Me and You and Everyone Else, da Miranda July que nos mostrou uma visão ternurenta. E o estranho Wild Blue Yonder, uma fantasia espacial, com o seu quê de cómico.

Se quiserem saber os resumos e os nomes dos realizadores, podem procurar na página oficial do indie, que no meu pc não abre, mas é qualquer coisa como www.indielisboa.com

terça-feira, abril 18, 2006

Guerra das Macros - Cont.


Mais uma vez, acedendo ao desafio da Formiguinha , aqui vai um amigo que se passeava no cimento aquecido ao sol mesmo ao lado da minha casinha das Travessas. Eu, que estava lá a fzer-lhe companhia, quis registar o momento. Ainda me deu uma trabalheira, porque ele é tímido, e fugia a sete pés da objectiva. Mas mesmo assim de costas, dá para ver que ele é um borracho, não dá?

sábado, abril 15, 2006

Boa Páscoa


Voltei das Travessas renovada e descansada, mesmo a tempo das celebrações pascais que tanto gosto. Volto como sempre, cheia de dúvidas acerca de onde pára a minha felicidade, e com centenas de fotos na mão. A Primavera é linda por lá.
Depois da Páscoa retomo a vida literária, até lá uma Santa e Feliz Páscoa para todos.

segunda-feira, abril 03, 2006

Mini-Férias


Vou passar uns dias junto da minha infância, a recarregar baterias e a passar algum tempo a meditar. Nunca estou sozinha por um minuto. Em casa estão sempre os meus pais, e às vezes falta-me passar algum tempo só comigo mesma.
Assim vou até às Travessas, passar o aniversário da minha avó. Ver se produzo alguma coisa e ultrapasso este bloqueio de escritora.
Há coisas das quais me vai custar estar afastada, nem que seja por uma semaninha. Já penso nos postais que vão chegar a minha casa sem eu estar cá para os acolher.
Vou ter saudades, sou assim, uma sentimentaloide mesmo por uma semaninha. Quando chego lá, quase que peço desculpa por ter ido, por me ter afastado. Por isso esperem sossegadinhos, que eu não demoro. Vão dando noticias. Passem pelas Travessas, pertinho de Gois, se quiserem. Eu vou lá estar mais a meia dúzia de velhotes que povoa aquele pedacinho de paraíso, não há que enganar, sou a única abaixo dos 70.