sexta-feira, setembro 30, 2005

Ester

Ester era uma perita de renome internacional em namoros platónicos. Tinha sempre um apaixonado com quem saía, ia ao cinema, ligavam-se todos os dias. Passeavam nos locais mais românticos, partilhavam a vida, só não tinham a intimidade física. E essa relação feliz durava, até ao dia em que ele partia nos braços de outra.
Nessa altura ela ficava destroçada, meditando no que tinha corrido mal, que passo da adolescência lhe tinha falhado para não permitir que as suas relações se desenrolassem normalmente.
Mas um novo afecto vinha sempre preencher o seu coração, repetir toda a encenação novamente. Ela era uma boa ouvinte, boa companheira, boa restauradora da auto-estima alheia, à custa da sua própria. E tudo começava de novo, como num ciclo que nunca fecha.
Ester hoje tem 60, e vive só, rodeada de sobrinhos e afilhados, frutos dos ex-amores que povoaram a sua vida.

terça-feira, setembro 27, 2005

CUIDADO! LINGUAGEM EXTREMAMENTE OBSCENA! NÃO LEIAM! DEPOIS NÃO DIGAM QUE EU NÃO AVISEI...

A minha vizinha de cima:
- Soninha, querida, engordaste um bocadinho?
"E o caralhinho, não?" pensei eu enquanto respondia:
- Sim, um bocadinho...
"sua puta intrometida!"
Não sei porquê, mas pareceu-me que este é um assunto sensível para mim.

Eu sei que é uma bimbice...

mas não arranjo companhia para ver 50 cent este sábado, e queria taaaaanto...

sábado, setembro 24, 2005

Saudades

Tenho saudades do Inverno, com os seus dias frios, e a humidade que nos faz parecer a todos fumadores. De andarmos mais vestidos, deixando apenas adivinhar as curvas sedutoras por baixo dos casacões, escondendo as imperfeições entre mantas de lã.
No Inverno somos todos mais diferentes e mais iguais. Com luvas ou gorros, cachecóis ou peles, casacões desportivos ou gabardines finas, subtilmente escondidos entre capotes e chapéus-de-chuva.
Somos flores que desabrocham no aconchego do ar condicionado, revelando novas formas por baixo do rolo de panos que traziam à entrada.
Gosto do Inverno, com os seus chás aromáticos e chocolates quentes, de ver filmes no sofá da sala, enrolada no cobertor vermelho. Da antecipação do Natal, das jantaradas com amigos para fugir ao frio.
O sexo sossegado por baixo dos lençóis, abrigados do frio e gerando calor. O mundo lá fora a desabar em chuva e vento, embalando o amor dentro das paredes quentes do quarto.

quinta-feira, setembro 22, 2005

Bati no fundo...

... e dediquei-me a bordar... valha-me a vida de desempregada!

segunda-feira, setembro 19, 2005

Casulo

Era um bocadinho germofóbica, e essa caracteristica tinha vindo a acentuar-se com o passar lento dos anos. Era um mulher nova ainda, mas há certos tiques que se vão tornando traços fortes de personalidade, quando ignorados e deixados a hibernar numa mente demasiado activa, e a sua mania das limpezas começava agora a ultrapassar as marcas.
Lavava meticulosamente as mãos enquanto entoava duas vezes o “Parabéns a Você”, como tinha visto um médico aconselhar no Jay Leno, numa das noites sem sono que povoavam a sua vida. Desinfectava todos os alimentos com umas gotas de lixivia, as roupas eram todas engomadas a altas temperaturas de modo a matar qualquer habitante indesejável.
Mas por mais que se esfregasse sentia-se sempre suja, como se a imundície da alma transbordasse, e fosse visível para todos os que a rodeavam. Tinha loucas tardes de sexo com completos desconhecidos, apenas para ter o que contar. Entregava-se de corpo, mas nunca de alma. Sujava-se com o suor e o sémen de homens que a desejavam, mas que jamais a conheceriam. Deixava que a usassem, que se satisfizessem nela.
Naquela tarde foi ter com ele ao seu apartamento, na morada que já conhecia de cor. Entrou, trocaram um cumprimento seco, e dirigiu-se logo ao quartinho dos fundos, única divisão da casa que conhecia. Despiu-se mecanicamente, pousou cuidadosamente as roupas na cadeira encostada à parede. Despiu-o a ele, com o que poderia parecer desvelo e cuidados, mas na realidade fazia apenas parte da encenação costumeira. Pendurou as suas roupas no cabide, imaculadas, prontas a vestir novamente no final da função.
Tocou-o, percorreu-o, deixou-se inundar com os seus fluidos quentes e abundantes. Como sempre, ele satisfez-se enquanto ela entregava vigorosamente o seu corpo, mas com os pensamentos dispersos numa galáxia distante. Terminou como sempre, num sorriso sem climax, actriz principal do seu próprio enredo. Limpou-se na toalha que ele lhe estendeu com amor, beijou-o com os lábios sedentos de atenção, e povoados de bactérias nocivas. Vestiu-se como se fugisse do local dum crime hediondo, pegou nas suas coisas e saiu porta fora, deixando-o como sempre com um sorriso inacabado, com o olhar interrompido.
Voltou de transportes públicos, partilhando o seu cheiro a sexo com o mundo, como se quisesse que todos sentissem a sua falta de amor, o seu excesso físico. Voltou para casa, fez a sua vida de todos os dias, sempre com a presença dele dentro dela, particulas aromáticas libertando-se lentamente da sua pele já suada pelo calor do dia. Olhava em redor tentando perceber se quem se cruzava com ela conseguia perceber o seu cheiro a pecado, o seu sabor a mel.
Ao fim do dia dirigiu-se finalmente à casa da banho. Esfregou as mãos meticulosamente enquanto entoava a canção do costume, esfregou os braços, desinfectou os dentes, despiu-se, entrou na banheira, onde passou a hora seguinte mergulhada em água bem quente e espuma purificante. Saiu, muito depois, banhada, hidratada e perfumada, mulher de pele nova, casca reluzente e interior em decomposição.

sexta-feira, setembro 16, 2005

Não sei se já vos disse...

... que simplesmente ODEIO ir a entrevistas de emprego...

quarta-feira, setembro 14, 2005

Postcrossing

Eu adoro receber correio. Do verdadeiro, daquele que vem um senhor entregar, e que nós podemos guradar numa caixinha, e ler anos mais tarde. Sempre troquei cartas com as minhas amigas mais distantes, na era pré-telemoveis, e ainda hoje as releio. Nas férias, mandava postais a toda a gente, e esperava impaciente que as respostas viessem aliviar o tédio que por vezes se sentia na terra da minha avó.
Hoje em dia já não se escreve realmente. O mail é uma coisa fantástica, que nos une rapidamente, e o telemóvel permite saber na hora como vai a gravidez da minha amiga de Aveiro.
Mas receber correio é uma alegria, com o seu que de infantil, a espera, a surpresa, "o que é que será que vem lá?". E alguém pensou nisso. E por acaso foi um português. E acho que já deve ter sido falado por aí na blogosfera, mas eu inscrevi-me neste site, fantástico para quem tinha saudades dos correios à antiga, como eu.
Por isso, para quem quiser trocar postais com gente de todo o mundo, é só ir até lá. Eu já mandei 3, já recebi dois, e continuo à espera do carteiro todos os dias, como na minha infância, na terra da minha avó.

terça-feira, setembro 13, 2005

Isto de ser mulher...

... é muito complicado.
Passo mais tempo fora da banheira a besuntar-me de cremes, que dentro a tomar banho.

segunda-feira, setembro 12, 2005

Mantis religiosa

louva_a_Deus.jpg

Todos os dias peço a Deus que me dê um maridinho. Levanto as mãos ao céu e rezo com fervor, esperando que venha ter comigo o companheiro com que sempre sonhei. Já tenho os braços deformados de tanto pedir, para sempre cristalizados nesta posição suplicante.
Mas depois de muito insistir, Deus lá se deixa comover, e manda-me um pequenitates, enfezado, para me fazer a corte. Mas eu até prefiro assim, não me sinto intimidada com o seu fraco aspecto. Mas ele tem de penar, que apesar de muito pedir, eu não me deixo levar assim com duas cantigas, há que ser cortejada à antiga.
Depois... depois só Deus sabe. Há quem me chame de bárbara, cruel, etc. e tal, mas eu apenas me preocupo com a saúde da minha descendência em tempos de carestia como os de hoje. Pois se o macho que Deus me manda é fraquito de carnes e parco em vontades, nada como arrancar-lhe a cabeça, que só traz vantagens. Por um lado, é nutritiva e eu garanto sustento aos meus ovos durante semanas. Por outro, ele deixa de pensar, manda as inibições e restrições sociais às urtigas, e os seus últimos momentos são os mais selvagens e orgásmicos de toda a sua vida.
Amigas, aprendam comigo. Peçam a Deus o homem dos vossos sonhos, e dêem-lhe um fim digno dos seus pesadelos.

quinta-feira, setembro 08, 2005

Chegou a altura de por pés a caminho...

pesacaminho.jpg

segunda-feira, setembro 05, 2005

Dançando

Enquanto dançava agarrada aquele poste de bronze no meio do palco, observava friamente a turba que a rodeava. Rebolava-se dum modo que muitos considerariam sensual, dentro duma tanga minúscula, e com os seus seios gigantescos abanando perante o olhar ávido e incrédulo de quem assistia ao espectáculo. Tinha os cabelos louros, à custa de anos de pinturas e descolorações agressivas, e umas lentes poderosas davam-lhe um olhar sedutoramente azul. Fora abençoada pela genética com umas longas pernas bem torneadas, e com um corpo magro e escultural, que deixava todos enlouquecidos.

Tinha um profundo desprezo pelos homens a quem era suposto excitar. Achava-os básicos, de uma simplicidade absurda. Fazia os mesmos movimentos todas as noites, ritmados e previsíveis, a mesma coreografia bacoca e pseudo-erótica, com um sorriso alienado nos lábios, olhando para um infinito inexistente, e para cada homem como se fosse o único da sala, e isso bastava para elevar o espírito de todos os que a rodeavam. Notavam-se as erecções mal disfarçadas por dentro das calças, as mãos que as acariciavam, mais ou menos discretas, consoante a classe e o nível do homem a quem pertenciam.

Mas por vezes estava lá um que se destacava de todos os outros. Não se contorcia na cadeira, não dava berros de incentivo, não estava rodeado duma imensidão de amigalhaços para potenciar a sua excitação. Olhava-a com o mesmo desprezo que ela votava a todos os outros que a rodeavam, e isso, mais que um desafio, era uma provocação. Ela tinha tomado aquele homem como a sua cruzada pessoal, faze-lo perder a compostura por si tinha-se tornado o seu objectivo.
Nas noites em que ele aparecia, todo o espectáculo decorria em função dele. Sorria-lhe, abanava-se na sua direcção, fazia coreografias cada vez mais ousadas. Mas nada parecia dar resultado, porque enquanto a multidão de homens anónimos à sua volta se agitava cada vez mais, aquele mantinha-se impassível, com o seu sorriso cínico a emoldurar-lhe o rosto.

Um dia comprou uns minutos no privado com ela, que viu aí finalmente uma oportunidade para se mostrar em todo o seu esplendor, e conseguir finalmente destabiliza-lo com o seu talento, tão eficaz nos outros homens. Dançou só para ele, ciosa do poder do seu corpo, que podia tocar mas não ser tocado. Provocou, deslizou, aflorou o fruto proibido, dum modo que deixaria qualquer outro homem louco de excitação. E enquanto a sua cara fazia a viagem das pernas dele até à cara, ele sussurrou-lhe ao ouvido: “Não me impressionas. Não quero ver a felina, a sedutora. Quero ver a menina que se perdeu aí dentro um dia."

sexta-feira, setembro 02, 2005

Parabéns

Janela.jpg

Às duas pessoas que resolveram o enigma que eu tinha colocado, NS e a seilá. A eles os meus parabéns, e o obrigado a todos os que participaram na minha brincadeira.
Realmente a foto era de um pormenor da janela do Convento de Cristo em Tomar, onde eu estive neste fim de semana.
E aqui fica a janela toda.