Tempos Modernos
Na minha matilha ainda não há esses problemas. O macho β, o que vem a seguir a mim na hierarquia, assim a modos que o vice-presidente, outro dia estava a dar-se ares de Afonso Henriques, a querer conquistar terreno, mas a minha Josefina deu-lhe cabo da saúde. Mostrou-lhe os dentes cá duma maneira, que ele não teve outro remédio senão meter o rabinho entre as pernas e ir embora. Era o que faltava, o meu lugar ninguém tira!
Mas a vida está difícil. Conta-se que em tempos, há muitos muitos anos, havia comida com abundância, coelhos a saltar por todo o lado, perdizes, esquilos, e até mesmo corças e veados. Um verdadeiro banquete.
Mas hoje já quase não há coelhos, e os que existem ou estão doentes ou cheios de chumbos. Já sobrevivo a escaravelhos e vegetais. A minha Josefina bem me diz para eu pensar que é salada de marisco, coisa fina. Mas eu não sou dado a estas modernices da nouvelle cuisine de baixas calorias. Lobo que é lobo tem de comer carne. E com pele, pelos e tudo.
Em dias santos lá se consegue uma cabra mais distraída, mas é muito arriscado. Sacanas dos cães não brincam em serviço, e os pastores já andam todos armados.
Outro dia estiveram cá uns senhores que dispararam contra a matilha toda. Só sei que quando acordámos estávamos todos com um brinco e um colar. A Josefina, que acordou antes de mim como sempre, diz que os ouviu dizer que nos vão seguir, e proteger a espécie, e mais não sei o quê. Eu só sei que isto ainda pesa, e eu bem me esfrego em tudo o que é árvore a tentar tirar. Mas a Josefina diz que até me dá um ar distinto, mais fashion... enfim, há que acompanhar os tempos.